Mundo
Presos políticos, execuções, torturas e fome, a realidade da Venezuela de Maduro
Missões de investigação no âmbito da ONU confirmaram graves violações dos direitos humanos no país que, segundo organizações como a Freedom House, não é uma democracia
Na Venezuela em mãos do regime comandado por Nicolás Maduro existem “bases razoáveis para sustentar” que desde 2014 são cometidas execuções extrajudiciais, torturas, detenções arbitrárias e abusos em matéria de violência sexual e de gênero.
Essas foram, em seus três relatórios, as conclusões apontadas pela missão de determinação de fatos criada no âmbito do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, que monitora a situação no país desde 2014, e tem mandato — renovado no ano passado — até 2024.
Outra missão, até o ano passado chefiada pela ex-presidente do Chile Michele Bachelet, assegurou em vários documentos que na Venezuela de Maduro foi limitado o espaço democrático, as instituições foram enfraquecidas e o Judiciário perdeu independência.
Com textos contundentes, como os que foram apresentados pelas missões da ONU, muitos deixaram de se referir à Venezuela como uma nação democrática. As gravíssimas denúncias contra Maduro, os que integram seu governo e as forças policiais do país explicam por que a Venezuela não é mais considerada uma democracia representativa por organizações de prestígio no mundo, como a Freedom House.
Em seu balance de 2022, o governo de Maduro é definido como um “regime”, e não mais como uma “democracia representativa”. Numa escala de 0 a 100 em matéria de democracia, a Venezuela tem 14 pontos, e é catalogada como um país “não livre”.
Repercussão de Lula na Venezuela
As falas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre as “narrativas” que circulam no mundo sobre a Venezuela causaram profundo mal-estar entre pesquisadores que há muito tempo acompanham a situação política e social no país, sobretudo em matéria de violações da Constituição, dos direitos civis e humanos. Especialistas estrangeiros não podem, por protocolos internos, opinar sobre declarações de um chefe de Estado. Mas fontes que conhecem as equipes de pesquisa afirmaram que o posicionamento de Lula causou surpresa e perplexidade.
As informações recolhidas por ambas missões deram força à investigação — atualmente em suspense — sobre supostos crimes de lesa-Humanidade cometidos no país no Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia, que envolve Maduro.
“Por mais que Lula grite que Maduro é um exemplo de democrata ele não vai convencer ninguém, e o único que perde é o próprio Lula. Se ele aspira a ter um papel nessa história, ficou desacreditado. Poderíamos ter esperado essa fala de Putin, mas não de Lula”, diz José Miguel Vivanco, ex-diretor para as Américas da Human Rights Wacht e sócio da Dentons Global Advisors.
Para o chileno Francisco Cox, um dos três integrantes da missão de determinação de fatos da ONU, “existem bases razoáveis para sustentar que na Venezuela são implementadas políticas de Estado que poderiam implicar crimes de lesa-Humanidade”.
“Essas políticas de Estado são a perseguição a opositores, e as operações das Forças de Ações Especiais (Faes). Existe uma política de execuções extrajudiciais, que conta com a participação de forças de segurança nacionais como o Serviço Bolivariano de Inteligência (Sebin) e a Guarda Nacional, entre outras”, afirma Cox.
Essa política de Estado tem, finalmente, frisou o especialista, “o objetivo de esmagar a oposição”.
“A existência de detenções arbitrárias e torturas leva à possibilidade de pensar num plano sistemático para cometer crimes de lesa-Humanidade. Por isso, e porque a Justiça venezuelana não investiga as cadeias de comando, as denúncias chegaram ao TPI”, explica Cox.
O processo no TPI está em suspenso desde o ano passado, porque após o procurador Karim Khan ter solicitado a abertura de uma investigação, o regime venezuelano solicitou um tempo para apresentar provas a seu favor. Segundo Cox, os documentos não fizeram o promotor mudar de ideia, e a decisão final está em mãos dos magistrados do TPI.
Os dados e informações que confirmam que há muito tempo a Venezuela deixou de ser um país que preze pela liberdade de seus cidadãos são muitos. ONGs locais como a Foro Penal monitoram permanentemente a situação dos 282 presos políticos confirmados, e seus advogados acompanham as vítimas da perseguição exercida pelo regime de Maduro. Do total de presos políticos, 151 são militares e 131 civis, e apenas 115 já foram condenados pela Justiça, de acordo com a oposição e com os relatórios das missões que funcionam no âmbito da ONU, absolutamente controlada pelo governo de Maduro.
Um dos presos políticos emblemáticos dos últimos anos é Javier Tarazona, vítima de uma detenção arbitrária há quase 700 dias, que está, como muitos outros, na famosa prisão chamada de Helicoide, em Caracas, sob o comando do Sebin. Tarazona foi acusado — ainda não condenado — de traição à pátria. Antes de ser preso, comentou Gonzalo Himiob, da Foro Penal, o dirigente do movimento Lápiz Venezuela denunciou a ação de grupos guerrilheiros da fronteira entre seu país e a Colômbia.
“Aqui na Venezuela já sabemos o que acontece, o que queremos saber agora é o que vai acontecer depois do que Lula falou. Porque qualquer abuso que for cometido por Maduro a partir de agora vai causar dano ao presidente do Brasil”, assegurou Antonio Ecarri, do movimento Lápis, que em março passado se reuniu com o assessor especial da Presidência da República, Celso Amorim, em Caracas.
Para ele, “com sua fala, Lula está obrigando Maduro a convocar um diálogo nacional, ser mais aberto, liberar os presos políticos e promover eleições limpas”.
“Maduro e o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) devem autorizar um calendário eleitoral respeitando os prazos constitucionais. Hoje temos um CNE melhor do que tínhamos há alguns anos, mas ainda não é independente”, enfatiza Ecarri.
Ele pretende se candidatar à Presidência em 2024, e sua principal bandeira é acabar com a fome no país, sobretudo das crianças e adolescentes.
“Hoje, 80% das crianças venezuelanas não tem o que comer. Se vamos falar de narrativas, essa é a que mais me interessa. As crianças comem, ou não comem?”, perguntou Ecarri.
A fome e a crise social já expulsaram cerca de sete milhões de venezuelanos de seu país (de um total de 28 milhões de habitantes), a grande maioria para vizinhos como Colômbia — onde vivem mais de 2 milhões —, Equador, Peru, Panamá, Chile, Argentina e Brasil. A Venezuela vive uma crise humanitária profunda, e a chamada migração forçada de seus habitantes está causando sérios problemas na região.
Mundo
Corte japonesa ordena que governo pague indenização por esterilizações forçadas
Cerca de 25 mil japoneses foram vítimas de lei que tinha objetivo de “prevenir aumento dos descendentes inferiores”
Numa decisão histórica, o Supremo Tribunal do Japão ordenou ao governo que pagasse indenizações às pessoas que foram esterilizadas à força ao abrigo de uma lei de eugenia agora extinta, decidindo que a prática era inconstitucional e violava os seus direitos.
A Lei de Proteção Eugênica, em vigor entre 1948 e 1996, permitiu às autoridades esterilizar à força pessoas com deficiência, incluindo aquelas com perturbações mentais, doenças hereditárias ou deformidades físicas e lepra. Também permitia abortos forçados se um dos pais tivesse essas condições.
A lei tinha como objetivo “prevenir o aumento dos descendentes inferiores do ponto de vista eugênico e também proteger a vida e a saúde da mãe”, segundo uma cópia da lei – que listava “notável desejo sexual anormal” e “notável inclinação clínica” entre as condições visadas.
Cerca de 25 mil pessoas foram esterilizadas sem consentimento durante esse período, de acordo com a decisão do tribunal, citando dados do ministério.
Embora o governo tenha oferecido compensar cada vítima em 3,2 milhões de ienes (cerca de US$ 19,8 mil) em 2019, ao abrigo de uma lei de assistência, as vítimas e os seus apoiadores argumentaram que isso estava longe de ser suficiente.
A decisão de quarta-feira (3) abordou cinco ações desse tipo, movidas por demandantes de todo o país em tribunais inferiores, que depois avançaram para a Suprema Corte.
Em quatro desses casos, os tribunais inferiores decidiram a favor dos demandantes – o que o Supremo Tribunal confirmou na quarta-feira, ordenando ao governo que pagasse 16,5 milhões de ienes (cerca de US$ 102 mil) aos atingidos e 2,2 milhões de ienes (US$13 mil) aos seus cônjuges.
No quinto caso, o tribunal de primeira instância decidiu contra os demandantes e rejeitou o caso, citando o prazo de prescrição de 20 anos. O Supremo Tribunal anulou esta decisão na quarta-feira, qualificando o estatuto de “inaceitável” e “extremamente contrário aos princípios de justiça e equidade”.
O caso agora é enviado de volta ao tribunal de primeira instância para determinar quanto o governo deve pagar.
“A intenção legislativa da antiga Lei de Proteção Eugênica não pode ser justificada à luz das condições sociais da época”, disse o juiz Saburo Tokura ao proferir a sentença, segundo a emissora pública NHK.
“A lei impõe um grave sacrifício sob a forma de perda da capacidade reprodutiva, o que é extremamente contrário ao espírito de respeito pela dignidade e personalidade individuais, e viola o artigo 13º da Constituição”, acrescentou – referindo-se ao direito de cada pessoa à vida, liberdade e a busca pela felicidade.
Após a decisão de quarta-feira, os manifestantes do fora do tribunal – homens e mulheres idosos, muitos em cadeiras de rodas – celebraram com os seus advogados e apoiadores, erguendo faixas onde se lia “vitória”.
Eles estão entre o total de 39 demandantes que entraram com ações judiciais nos últimos anos – seis deles morreram desde então, de acordo com a NHK, destacando a urgência desses casos à medida que as vítimas chegam aos seus anos finais.
Numa conferência de imprensa após a decisão do tribunal, o secretário-chefe do gabinete, Yoshimasa Hayashi, expressou o remorso e o pedido de desculpas do governo às vítimas, informou a NHK. O governo pagará prontamente a compensação e considerará outras medidas, como uma reunião entre os demandantes e o primeiro-ministro Fumio Kishida, disse ele.
Este conteúdo foi criado originalmente em inglês.
versão original
Mundo
Polícia desmobiliza protesto pró-Palestina no parlamento australiano
Manifestantes carregavam faixa em que denunciavam Israel por crimes de guerra
Quatro manifestantes pró-Palestina foram levados sob custódia policial nesta quinta-feira (4) depois de escalarem o telhado do parlamento australiano em Canberra.
Os manifestantes, vestidos com roupas escuras, permaneceram no telhado do prédio por cerca de uma hora. Eles estenderam faixas pretas, incluindo uma que dizia “Do rio ao mar, a Palestina será livre”, um refrão comum dos manifestantes pró-Palestina, e entoaram slogans.
Os manifestantes empacotaram suas faixas antes de serem levados pela polícia que os aguardava por volta das 11h30, horário local.
Mundo
Reino Unido vai às urnas hoje em eleição que deve tirar Conservadores do poder
País se prepara para entrar em uma nova era política com provável derrota do grupo há 14 anos no comando
Os britânicos vão às urnas nesta quinta-feira (4) em uma votação histórica para eleger um novo parlamento e governo nas eleições gerais. Pesquisas atuais indicam que o atual primeiro-ministro Rishi Sunak, do Partido Conservador, vai perder, encerrando uma era de 14 anos do grupo no poder.
A eleição é um referendo sobre o tumultuado governo dos Conservadores, que estão no comando do Reino Unido desde 2010 e passaram por uma crise financeira global, o Brexit e a pandemia.
Se os Trabalhistas obtiverem 419 assentos ou mais, será o maior número de assentos já conquistados por um único partido, superando a vitória esmagadora de Tony Blair em 1997.
Como funcionam as eleições?
O parlamento britânico tem 650 assentos. Para ter maioria, é preciso conseguir 326 assentos.
Após uma campanha de semanas, as urnas serão abertas às 7h, no horário local, desta quinta-feira (3h, horário de Brasília), e permanecerão abertas até às 22h.
Os britânicos podem votar em cada um dos 650 distritos eleitorais do país, selecionando o candidato que representará a área.
O líder do partido que ganhar a maioria desses distritos eleitorais se torna primeiro-ministro e pode formar um governo.
Se não houver maioria, eles precisam procurar ajuda em outro lugar, governando como um governo minoritário — como Theresa May fez após um resultado acirrado em 2017 — ou formando uma coalizão, como David Cameron fez depois de 2010.
O monarca tem um papel importante, embora simbólico. O rei Charles III deve aprovar a formação de um governo, a decisão de realizar uma eleição e a dissolução do Parlamento. O rei nunca contradiz seu primeiro-ministro ou anula os resultados de uma eleição.
A votação antecipada desta quarta-feira (4) foi convocada por Sunak. O atual primeiro-ministro era obrigado a divulgar uma eleição até janeiro de 2025, mas a decisão de quando fazê-lo cabia somente a ele.
O evento, contudo, provavelmente inaugurará um governo de centro-esquerda liderado pelo ex-advogado, Keir Starmer.
Quem é Keir Starmer?
O rival de Rishi Sunak é o líder trabalhista Keir Starmer, que é amplamente favorito para se tornar o novo primeiro-ministro britânico.
Ex-advogado de direitos humanos muito respeitado que então atuou como o promotor mais sênior do Reino Unido, Starmer entrou na política tarde na vida.
Starmer se tornou um parlamentar trabalhista em 2015 e menos de cinco anos depois era o líder do partido, após uma passagem como secretário do Brexit no Gabinete Paralelo durante a saída prolongada do Reino Unido da União Europeia.
O britânico herdou um partido que se recuperava de sua pior derrota eleitoral em gerações, mas priorizou uma reformulação da cultura, se desculpando publicamente por um escândalo de antissemitismo de longa data que manchou a posição do grupo com o público.
Starmer tentou reivindicar o centro político do Reino Unido e é descrito por seus apoiadores como um líder sério e de princípios. Mas seus oponentes, tanto na esquerda de seu próprio partido quanto na direita do espectro político, dizem que ele não tem carisma e ideias, e o acusam de não ter conseguido estabelecer uma visão ambiciosa e ampla para a nação.
Quando saíram os resultados?
Após a abertura das urnas nesta quinta-feira (3), a mídia britânica estará proibida de discutir qualquer coisa que possa afetar a votação.
Mas no momento que a votação acabar, uma pesquisa de boca de urna será divulgada e definirá o curso da noite. A pesquisa, feita pela Ipsos para a BBC, ITV e Sky, projeta a distribuição de assentos do novo parlamento, e historicamente tem sido muito precisa.
Os resultados reais são contados ao longo da noite; o escopo do resultado da noite geralmente fica claro por volta das 3 da manhã, horário local (23h, horário de Brasília), e o novo primeiro-ministro geralmente assume o cargo ao meio-dia.
Mas as coisas podem demorar mais se o resultado for apertado ou se as vagas principais forem decididas na reta final.
De qualquer forma, a transferência de poder acontecerá no fim de semana, dando ao novo governo algumas semanas para trabalhar em legislações importantes antes do recesso parlamentar de verão.
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