Mundo
No auge do poder, Angela Merkel sai da crise ainda mais forte
A chanceler é admirada pelo pulso firme, pelo plano de recuperação da economia europeia que ajudou a montar — e por esnobar Trump
Faz tempo que Angela Merkel, a chanceler da Alemanha, é a voz mais poderosa da Europa, tanto pela capacidade de gestão quanto pela falta de competição à altura. Uma série de fatores, porém, parecia estar abrindo fendas na armadura de competência da senhora de 65 anos, sempre de terninho e salto baixo e sem um pingo de glamour, que está completando quinze anos no governo. A primeira trinca foi sentida quando ela marcou data para sair: há dois anos, anunciou que não concorreria a um novo mandato de deputada, que acaba em 2021, abrindo mão da liderança da União Democrata Cristã (CDU) e do comando do país. Depois, atravessou, em público, três constrangedores episódios de tremedeira incontrolável — assegurou que os acessos não atrapalhavam em nada seu desempenho e foi em frente. Em meio a tudo isso, o CDU perdeu o parceiro de coalizão, saiu-se pior do que esperava em eleições regionais e viu a extrema direita se tornar uma ameaça real.
Quando se pensava que Merkel tinha assumido a posição de lame duck — o “pato manco” que não acompanha o bando e fica sujeito a ataques de predadores, expressão que, em inglês, designa um político sem expressão —, eis que ela novamente se firma no topo: segundo pesquisa recente, conta com a aprovação de 79% dos alemães e caminha, isso sim, para um fim de carreira dos mais excepcionais. “Merkel nunca será vista como uma líder carismática, mas sabe administrar como ninguém a política do dia a dia”, define Karl-Theodor zu Guttenberg, que foi seu ministro da Defesa entre 2009 e 2011.
Contribuiu muito para a renovada admiração pela chanceler a forma como conduziu o combate ao novo coronavírus. Combinando clareza de decisões com tecnologia de ponta e serviço médico de qualidade, ela conteve o contágio, limitou o número de mortos e impediu a repetição, em seu país, das cenas de sofrimento vistas nos vizinhos — de quebra, ganhou 11 pontos no índice de popularidade só de março para cá. Passado o pior da pandemia, é Merkel agora quem está no comando do ousado plano de reconstrução das economias da União Europeia. Ao lado do francês Emmanuel Macron, anunciou a injeção de 500 bilhões de euros para os países do Sul, os mais afetados, em condições muito menos rígidas do que as usuais — Merkel sempre foi feroz guardiã da chave do cofre do bloco.
Na mesma UE, provando que não dá ponto sem nó, Merkel garantiu seu legado instalando na presidência do órgão executivo, a Comissão Europeia, uma ex-ministra de seu governo, Ursula von der Leyen. Em outra jogada acertada, o projeto de recuperação econômica tem tempero ecológico — questão que mobiliza a juventude europeia —, prevendo vastos recursos para as indústrias verdes e outros passos na direção da total neutralização das emissões de carbono nos 27 integrantes da UE. A propósito, o meio ambiente é uma das bandeiras do francês Macron, que sonha um dia ocupar na UE o protagonismo de uma Merkel. Para coroar, a chanceler alemã esnobou Donald Trump — figura de pouquíssimos amigos na Europa — ao anunciar que não iria ao encontro do G7 marcado para junho (e adiado para setembro) em Washington. Foi a primeira a fazê-lo, alegando a necessidade de fiscalizar o controle da pandemia, e assim frustrou os planos do presidente americano de usar a presença dos líderes mundiais mais importantes como demonstração de normalidade nos Estados Unidos.
Filha de um pastor luterano, Merkel foi criada na Alemanha Oriental, o lado comunista do país, e conquistou um ph.D. em química quântica pela Universidade de Leipzig — a origem, segundo estudiosos da política europeia, de sua excepcional capacidade analítica e do método científico de tomar decisões. Cada desafio é submetido a comparações, projeção de cenários, ponderação de riscos e a longa reflexão, sem espaço para emoções — todas as esferas de seu governo são guiadas por critérios técnicos. Agindo dessa forma, ela soube, por exemplo, tirar partido da ascensão da China, o que levou o comércio bilateral a passar dos 200 bilhões de euros anuais. Tornou-se também a principal ponte entre o Ocidente e a Rússia (ela fala russo com fluência), sendo a única chefe de Estado que Vladimir Putin trata com deferência. Em relação a Trump, percebeu logo que, com ele, a parceria entre Europa e Estados Unidos não era mais a mesma e não insistiu em uma aproximação. “Merkel é extremamente pragmática e guiada por metas”, diz Dan Hough, professor de ciências políticas da Universidade de Sussex.
Apesar da boa fase da chanceler, os problemas internos continuam e o CDU passa por um momento difícil. Em fevereiro, a sucessora que Merkel ungiu pessoalmente, Annegret Kramp-Karrenbauer (o nome de difícil pronunciação costuma ser abreviado para AKK), desistiu da candidatura ao cargo de chanceler e abandonou a presidência do partido depois que um braço da legenda se aliou, em uma eleição regional, ao Alternativa para a Alemanha (AfD), de extrema direita — hoje a terceira força política alemã. Os tropeços partidários não arranharam a imagem de Merkel. A Mutti (Mãe), como os alemães apelidaram a chanceler, que não tem filhos, há de pôr ordem na casa.
Mundo
Corte japonesa ordena que governo pague indenização por esterilizações forçadas
Cerca de 25 mil japoneses foram vítimas de lei que tinha objetivo de “prevenir aumento dos descendentes inferiores”
Numa decisão histórica, o Supremo Tribunal do Japão ordenou ao governo que pagasse indenizações às pessoas que foram esterilizadas à força ao abrigo de uma lei de eugenia agora extinta, decidindo que a prática era inconstitucional e violava os seus direitos.
A Lei de Proteção Eugênica, em vigor entre 1948 e 1996, permitiu às autoridades esterilizar à força pessoas com deficiência, incluindo aquelas com perturbações mentais, doenças hereditárias ou deformidades físicas e lepra. Também permitia abortos forçados se um dos pais tivesse essas condições.
A lei tinha como objetivo “prevenir o aumento dos descendentes inferiores do ponto de vista eugênico e também proteger a vida e a saúde da mãe”, segundo uma cópia da lei – que listava “notável desejo sexual anormal” e “notável inclinação clínica” entre as condições visadas.
Cerca de 25 mil pessoas foram esterilizadas sem consentimento durante esse período, de acordo com a decisão do tribunal, citando dados do ministério.
Embora o governo tenha oferecido compensar cada vítima em 3,2 milhões de ienes (cerca de US$ 19,8 mil) em 2019, ao abrigo de uma lei de assistência, as vítimas e os seus apoiadores argumentaram que isso estava longe de ser suficiente.
A decisão de quarta-feira (3) abordou cinco ações desse tipo, movidas por demandantes de todo o país em tribunais inferiores, que depois avançaram para a Suprema Corte.
Em quatro desses casos, os tribunais inferiores decidiram a favor dos demandantes – o que o Supremo Tribunal confirmou na quarta-feira, ordenando ao governo que pagasse 16,5 milhões de ienes (cerca de US$ 102 mil) aos atingidos e 2,2 milhões de ienes (US$13 mil) aos seus cônjuges.
No quinto caso, o tribunal de primeira instância decidiu contra os demandantes e rejeitou o caso, citando o prazo de prescrição de 20 anos. O Supremo Tribunal anulou esta decisão na quarta-feira, qualificando o estatuto de “inaceitável” e “extremamente contrário aos princípios de justiça e equidade”.
O caso agora é enviado de volta ao tribunal de primeira instância para determinar quanto o governo deve pagar.
“A intenção legislativa da antiga Lei de Proteção Eugênica não pode ser justificada à luz das condições sociais da época”, disse o juiz Saburo Tokura ao proferir a sentença, segundo a emissora pública NHK.
“A lei impõe um grave sacrifício sob a forma de perda da capacidade reprodutiva, o que é extremamente contrário ao espírito de respeito pela dignidade e personalidade individuais, e viola o artigo 13º da Constituição”, acrescentou – referindo-se ao direito de cada pessoa à vida, liberdade e a busca pela felicidade.
Após a decisão de quarta-feira, os manifestantes do fora do tribunal – homens e mulheres idosos, muitos em cadeiras de rodas – celebraram com os seus advogados e apoiadores, erguendo faixas onde se lia “vitória”.
Eles estão entre o total de 39 demandantes que entraram com ações judiciais nos últimos anos – seis deles morreram desde então, de acordo com a NHK, destacando a urgência desses casos à medida que as vítimas chegam aos seus anos finais.
Numa conferência de imprensa após a decisão do tribunal, o secretário-chefe do gabinete, Yoshimasa Hayashi, expressou o remorso e o pedido de desculpas do governo às vítimas, informou a NHK. O governo pagará prontamente a compensação e considerará outras medidas, como uma reunião entre os demandantes e o primeiro-ministro Fumio Kishida, disse ele.
Este conteúdo foi criado originalmente em inglês.
versão original
Mundo
Polícia desmobiliza protesto pró-Palestina no parlamento australiano
Manifestantes carregavam faixa em que denunciavam Israel por crimes de guerra
Quatro manifestantes pró-Palestina foram levados sob custódia policial nesta quinta-feira (4) depois de escalarem o telhado do parlamento australiano em Canberra.
Os manifestantes, vestidos com roupas escuras, permaneceram no telhado do prédio por cerca de uma hora. Eles estenderam faixas pretas, incluindo uma que dizia “Do rio ao mar, a Palestina será livre”, um refrão comum dos manifestantes pró-Palestina, e entoaram slogans.
Os manifestantes empacotaram suas faixas antes de serem levados pela polícia que os aguardava por volta das 11h30, horário local.
Mundo
Reino Unido vai às urnas hoje em eleição que deve tirar Conservadores do poder
País se prepara para entrar em uma nova era política com provável derrota do grupo há 14 anos no comando
Os britânicos vão às urnas nesta quinta-feira (4) em uma votação histórica para eleger um novo parlamento e governo nas eleições gerais. Pesquisas atuais indicam que o atual primeiro-ministro Rishi Sunak, do Partido Conservador, vai perder, encerrando uma era de 14 anos do grupo no poder.
A eleição é um referendo sobre o tumultuado governo dos Conservadores, que estão no comando do Reino Unido desde 2010 e passaram por uma crise financeira global, o Brexit e a pandemia.
Se os Trabalhistas obtiverem 419 assentos ou mais, será o maior número de assentos já conquistados por um único partido, superando a vitória esmagadora de Tony Blair em 1997.
Como funcionam as eleições?
O parlamento britânico tem 650 assentos. Para ter maioria, é preciso conseguir 326 assentos.
Após uma campanha de semanas, as urnas serão abertas às 7h, no horário local, desta quinta-feira (3h, horário de Brasília), e permanecerão abertas até às 22h.
Os britânicos podem votar em cada um dos 650 distritos eleitorais do país, selecionando o candidato que representará a área.
O líder do partido que ganhar a maioria desses distritos eleitorais se torna primeiro-ministro e pode formar um governo.
Se não houver maioria, eles precisam procurar ajuda em outro lugar, governando como um governo minoritário — como Theresa May fez após um resultado acirrado em 2017 — ou formando uma coalizão, como David Cameron fez depois de 2010.
O monarca tem um papel importante, embora simbólico. O rei Charles III deve aprovar a formação de um governo, a decisão de realizar uma eleição e a dissolução do Parlamento. O rei nunca contradiz seu primeiro-ministro ou anula os resultados de uma eleição.
A votação antecipada desta quarta-feira (4) foi convocada por Sunak. O atual primeiro-ministro era obrigado a divulgar uma eleição até janeiro de 2025, mas a decisão de quando fazê-lo cabia somente a ele.
O evento, contudo, provavelmente inaugurará um governo de centro-esquerda liderado pelo ex-advogado, Keir Starmer.
Quem é Keir Starmer?
O rival de Rishi Sunak é o líder trabalhista Keir Starmer, que é amplamente favorito para se tornar o novo primeiro-ministro britânico.
Ex-advogado de direitos humanos muito respeitado que então atuou como o promotor mais sênior do Reino Unido, Starmer entrou na política tarde na vida.
Starmer se tornou um parlamentar trabalhista em 2015 e menos de cinco anos depois era o líder do partido, após uma passagem como secretário do Brexit no Gabinete Paralelo durante a saída prolongada do Reino Unido da União Europeia.
O britânico herdou um partido que se recuperava de sua pior derrota eleitoral em gerações, mas priorizou uma reformulação da cultura, se desculpando publicamente por um escândalo de antissemitismo de longa data que manchou a posição do grupo com o público.
Starmer tentou reivindicar o centro político do Reino Unido e é descrito por seus apoiadores como um líder sério e de princípios. Mas seus oponentes, tanto na esquerda de seu próprio partido quanto na direita do espectro político, dizem que ele não tem carisma e ideias, e o acusam de não ter conseguido estabelecer uma visão ambiciosa e ampla para a nação.
Quando saíram os resultados?
Após a abertura das urnas nesta quinta-feira (3), a mídia britânica estará proibida de discutir qualquer coisa que possa afetar a votação.
Mas no momento que a votação acabar, uma pesquisa de boca de urna será divulgada e definirá o curso da noite. A pesquisa, feita pela Ipsos para a BBC, ITV e Sky, projeta a distribuição de assentos do novo parlamento, e historicamente tem sido muito precisa.
Os resultados reais são contados ao longo da noite; o escopo do resultado da noite geralmente fica claro por volta das 3 da manhã, horário local (23h, horário de Brasília), e o novo primeiro-ministro geralmente assume o cargo ao meio-dia.
Mas as coisas podem demorar mais se o resultado for apertado ou se as vagas principais forem decididas na reta final.
De qualquer forma, a transferência de poder acontecerá no fim de semana, dando ao novo governo algumas semanas para trabalhar em legislações importantes antes do recesso parlamentar de verão.
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